OAB quer apurar se houve excessos na ação policial em Varginha
A Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Minas Gerais, acompanhará as investigações sobre a operação que culminou com a morte de 26 suspeitos em Varginha, no Sul de Minas Gerais. Nenhum policial foi ferido. Em ação realizada pelas Polícias Rodoviárias Federal (PRF) e Militar (PMMG), a quadrilha foi desbaratada na madrugada de ontem, com recolhimento de farto armamento, segundo a política, usado em operaçõs de guerra.
“É importante que haja essa apuração. Tenho toda confiança no trabalho da Polícia Judiciária, que tem isenção e capacidade técnica para levar a cabo e apurar esse evento que, de fato, traz repercussão grande pelo número de mortes”, afirmou o presidente da comissão, Rômulo Ferraz.
Ele conversou com o comandante-geral da PM, coronel Rodrigo, e o chefe da Polícia Civil, Joaquim Francisco, para saber como foi realizada a apuração. Segundo Rômulo Ferraz, o Serviço de Inteligência da Polícia Rodoviária Federal (PRF) estava monitorando o grupo, que planejava ação para atacar bancos em Varginha. Também devem acompanhar as investigações o Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado e o Ministério Público.
A Polícia Civil instaurou inquérito policial para apurar os fatos, e o processo será analisado pela Comarca de Varginha. Apesar do elevado número de mortes, Rômulo afirmou que ainda não há elementos para dizer se houve excesso na operação. Ele lembrou que no período em que foi secretário Estadual de Defesa Social, ocorreu evento semelhante, quando foi feita a identificação de uma quadrilha que explodia caixas eletrônicos no estado. “Tenho experiência pessoal, quando fui secretário houve um caso muito parecido, em 2013, no município de Itamonte em que morreram 12 agentes, eram inclusive todos do estado de São Paulo que estavam fazendo várias explosões nos bancos da divisa entre Minas e São Paulo. Foi também um trabalho de inteligência.”
Além de carreta modificada que seria usada pela quadrilha, de acordo com a PM, foram apreendidos vários carros durante a ação policial
Em nota, a presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa de Minas, a deputada Andréia de Jesus (PSOL), afirmou que está acompanhando o caso. “Estamos disponíveis para realizar a fiscalização e identificar qualquer violação de direitos humanos que possa ter ocorrido.” A deputada também prestou solidariedade às famílias dos homens mortos e se colocou à disposição para o que for necessário.
‘Assinatura’ De acordo com o comandante do Bope, tenente-coronel Rodolfo César Morotti, a quadrilha teria recebido apoio de alguém na região. “Certamente essas quadrilhas são muito organizadas em âmbito nacional. Geralmente, elas contam com alguma pessoa que dá apoio nas cidades”, afirmou, durante a entrevista coletiva de representantes do comando da operação conjunta da PMMG e PRF. A delegada regional de Varginha, Renata Fernanda Gonçalves de Rezende, confirmou que o grupo teria recebido apoio de pessoas de outros estados.
Os participantes da quadrilha estavam acomodados em dois sítios distantes da área central de Varginha. “São rotas diferentes para facilitar a fuga. As investigações ainda estão acontecendo, mas criminosos deixam uma assinatura, jeito de agir, armamento, roupas. Inclusive, os explosivos deixados levam a crer que são da mesma quadrilha”, disse o comandante do Bope.
Segundo o tenente-coronel Rodolfo Morotti, durante a ação os criminosos tentaram fugir, mas foram capturados. “Tudo isso foi pensado e planejado para ter êxito. Uma ação que poderia ter muitos danos para a sociedade teve uma resposta satisfatória. Eles tinham armamento que derrubava até aeronave. Uma quadrilha muito organizada.”
A origem do material ainda não foi confirmada. “Tem casos que eles chegam a usar armamento alugado”, informou comandante do Bope. Durante a ação, nove veículos foram recuperados, além de uma carreta apreendida em Muzambinho, também no Sul de Minas. “Não conseguimos identificar essa carreta chegando na região. Verificamos o veículo estacionado em Muzambinho. O veículo estava modificado, com um fundo falso e cheio de colchonete e tinha parte de uma carga”, destacou o Inspetor da PRF, Rodrigo Diniz.
No confronto, 26 criminosos morreram e nenhum militar ficou ferido. “Há meses que a gente vem recebendo denúncias que Varginha e região poderiam ter ataque a instituições financeiras. Foi uma ação planejada e de prevenção”, ressalta o tenento-coronel Marcos Serpa.
Rastrear armas é maior desafio
Ivan Drummond
A origem do arsenal de armas que o grupo criminoso do novo cangaço, flagrado em Varginha pela ação da PMMG e PRF, é, agora, o desafio das autoridades. A pergunta está sendo feita às Polícias Federal e Polícia Civil, que deverão investigar o caso. Em grande parte, havia armamento de uso exclusivo das Forças Armadas, cujo comércio é proibido ao público.
Segundo o tenente-coronel Flávio Santiago, chefe da assessoria de imprensa da PM, o arsenal é de guerra. “A quadrilha possuía um verdadeiro arsenal de guerra, sendo apreendidos fuzis, metralhadoras ponto 50, explosivos e coletes à prova de balas, além de vários veículos roubados. Ela tem uma munição antitanque de alta energia.”
Sabe-se que no Brasil, o desvio de armas e munições dos quartéis das polícias e do Exército para facções criminosas, clubes de tiro e milícias virou rotina. O último caso ocorreu na Vila Militar de Deodoro, no Rio de Janeiro, em janeiro deste ano. Além disso, há casos de soldados e mesmo policiais, como um sargento baiano, de 52 anos, flagrado com três armas exclusivas das Forças Armadas, que seriam repassadas a traficantes. Ele foi preso em flagrante, em maio do ano passado, em Salvador.